Acordamos revigorados depois de uma boa noite de sono, mas ainda com um certo aperto no peito. Na noite anterior, assim que chegamos na casa onde nos hospedamos, o tempo virou de repente — o vento ficou forte e a chuva caiu com força, nos deixando inseguros sobre o que viria no dia seguinte.
O plano era seguir até Curuípe e nos hospedar na famosa Praia do Espelho, um trajeto que eu já tinha lido a respeito e estava animada para fazer. Mas, com aquele clima instável, bateu a preocupação: será que o tempo ia colaborar?
Para nossa surpresa, o dia amanheceu espetacular! Céu claro, sol brilhando e aquele clima perfeito para uma boa aventura. Foi o empurrão que faltava para sairmos animados e confiantes rumo ao próximo destino.
- Data: 14/06/2025
- Tábua das Marés: vazia 11h28 - 0,46m
- Distancia: 26 km
- Dificuldade: Médio/Difícil
Logo na saída de Corumbau, fomos surpreendidos por uma cena que parecia saída de um sonho marinho. Diante de uma pequena agência de passeios, erguia-se uma imponente réplica de baleia Jubarte — tão real que parecia prestes a mergulhar de volta ao mar.
Era impossível simplesmente passar. Paramos, é claro, encantados com aquele símbolo da natureza grandiosa que nos rodeava. Registramos o momento com a mesma empolgação de quem avista a primeira estrela cadente: olhos brilhando, corações despertos. Um presságio poético do que nos esperava adiante na rota das gigantes do oceano.
Seguimos rumo ao rio Corumbau, embalados pela expectativa da travessia. Nosso objetivo era simples: encontrar uma canoa para cruzar até o outro lado. E como essa travessia faz parte da rotina de quem vive ali, não demorou até avistarmos algumas, prontas para nos levar.
Negociamos rápido, e por R$ 20,00 cada um, embarcamos nessa pequena aventura sobre as águas calmas do rio. A travessia foi breve, mas cheia de charme — daquelas experiências simples que dão sabor à jornada.
Eu já havia lido que, à beira do rio, é comum encontrar crianças indígenas oferecendo colares de conchas e pequenos artesanatos aos viajantes — e assim foi. Logo após a travessia, algumas se aproximaram, tímidas e sorridentes, trazendo consigo a delicadeza da cultura local em forma de arte. Um encontro simples, mas cheio de significado.
Também vimos buggys partindo em direção a Caraíva, saindo dali em passeios diários. A ideia de seguir de buggy por aquelas paisagens me pareceu divertida, quase uma aventura cinematográfica. Mas nossas bicicletas, fiéis companheiras, não cabiam nesse roteiro.
A areia fofa e inclinada tornava impossível pedalar na praia. Então, seguimos por uma estrada paralela, atravessando quilômetros de vegetação e silêncio, com o som do mar sempre por perto.
Após cerca de cinco quilômetros, cruzamos uma guarita que anunciava algo especial: estávamos entrando na Aldeia Pataxó. Dali em diante, o caminho seria sagrado — à nossa esquerda, a faixa de areia do Parque Nacional do Monte Pascoal; à direita, as terras da comunidade indígena Barra Velha. Era como atravessar um portal entre natureza e ancestralidade.
Seguimos de bicicleta rumo a Caraíva por uma estrada de terra paralela ao mar — plana e tranquila, usada pelos moradores que se deslocam entre as comunidades e o Parque do Monte Pascoal. O trajeto, cercado por verde e brisa, parecia nos conduzir com calma, como quem conta segredos de quem vive por ali há gerações.
Em certo ponto, percebemos que a estrada fazia uma longa volta antes de alcançar a vila. Com o mar tão perto, decidimos arriscar: voltamos à praia, mesmo sabendo que a areia poderia nos desafiar.
Entre trechos pedalando e outros empurrando as bicicletas com o esforço que só a aventura exige, seguimos firmes, com o vilarejo se aproximando a cada passo. O esforço valeu a pena — Caraíva, com sua aura rústica e acolhedora, nos esperava como recompensa de quem não desistiu do caminho.
Nascido há cerca de 100 anos da união entre indígenas e escravizados, o vilarejo de Caraíva carrega nas veias a força da resistência e nas ruas de areia a simplicidade do passado. Rústico e encantador, ainda preserva o jeito ribeirinho de viver: poucas casas, nada de asfalto, e por muito tempo, nem mesmo luz elétrica.
No passado, Caraíva foi um dos polos da extração e transporte de madeira — hoje quase inexistente por ali. Com o tempo, o vilarejo trocou o som dos machados pelo das ondas e do forró. A pesca ainda sustenta muitos dos moradores, mas pousadas e bares já surgiram entre as árvores e casinhas coloridas, acolhendo aventureiros que chegam buscando não só paisagem.
Antes de alcançar o rio, viramos à esquerda e entramos numa pequena trilha encantadora, cercada pela vegetação nativa e iluminada pela luz suave que filtrava entre as folhas. O caminho tinha algo de mágico, como se guardasse segredos contados apenas a quem passa devagar.

O clima parecia em perfeita sintonia com a paisagem — céu limpo, mar cintilante, brisa suave. Mas o sol, generoso em beleza, também cobrava seu preço. O calor começava a pesar, e cada pedalada exigia mais do corpo.
Reconhecendo o limite, decidimos fazer uma pausa estratégica. Paramos para nos reidratar, respirar fundo e absorver não só a água, mas também o cenário ao redor — uma pausa revigorante no meio da jornada, que nos lembrava da importância de escutar o próprio ritmo.
De volta ao alto de uma falésia, retomamos o pedal por trilhas que pareciam esculpidas pela própria natureza. O visual era de tirar o fôlego — cada curva revelava novas cores, texturas e silêncios que ficariam gravados na memória.
Em um trecho especial, nos deparamos com um mirante natural, um presente no caminho. Paramos ali por alguns instantes, hipnotizados pela imensidão azul do mar e pela beleza serena da paisagem. Era como se o mundo tivesse desacelerado só para nos deixar contemplar.
Tudo parecia se encaixar perfeitamente naquele dia — o sol, a paisagem, a sensação de conquista ao chegar à tão sonhada Praia do Espelho. Estávamos vivendo um daqueles momentos que merecem moldura. Mas, como a vida gosta de nos lembrar que nada é completamente previsível, veio o inesperado.
Ao voltarmos para o quarto, os funcionários pediram que levássemos as bikes conosco — algo comum, que já estávamos acostumados a fazer. O problema é que nosso quarto ficava no ponto mais alto do hotel, acessível apenas por uma escadaria generosa. E foi ali, entre degraus e distração, que tudo mudou.
Pisei em falso num degrau mais alto, não vi o desnível… e caí. O tombo foi feio. A dor no tornozelo veio imediata e intensa, como um alerta claro de que algo estava errado. Subi mancando, com o coração acelerado, e pedi ao Filipe que trouxesse gelo.
Logo o inchaço apareceu, acompanhado de um tom arroxeado que não deixava espaço para ilusões. Fiquei apavorada. Será que a viagem terminaria ali? A pergunta martelava na minha mente enquanto eu passava a noite acordando entre compressas, tentando conter o pior, na esperança silenciosa de um pequeno milagre ao amanhecer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário